sábado, 31 de julho de 2010

O CICLO DO CARANGUEIJO - Obra de Anna Guerra, uma saudade do meu Recife




O CICLO DO CARANGUEIJO

"O caboclo Zé Luís da Silva não quis desanimar. Adaptou-se: "Quem não tem remédio, remediado está." Entrou na luta da cidade com todas as forças de que dispunha, mas as forças dele não rendiam que desse para a família viver com casa, roupa e comida. Casa só de 80 mil réis para cima, para comida uns 150 e os salários sem passarem de 5 mil réis por dia.Começou o arrôcho. Só havia uma maneira de desapertar: era cair no mangue. No mangue não se paga casa, come-se caranguejo e anda-se quase nu. O mangue é um paraíso. Sem o cor-de-rosa e o azul do paraíso celeste, mas com as cores negras da lama, paraíso dos caranguejos.No mangue o terreno não é de ninguém. É da maré. Quando ela enche, se estira e se espreguiça, alaga a terra toda, mas quando ela baixa e se encolhe, deixa descobertos os calombos mais altos. Num deles, o caboclo Zé Luís levantou o seu mocambo. As paredes de varas de mangue e lama amassada. A coberta de palha, capim seco e outros materiais que o monturo fornece. Tudo de graça encontrado ali mesmo numa bruta camaradagem com a natureza. O mangue é um camaradão. Dá tudo, casa e comida: mocambo e caranguejo.Agora, quando o caboclo sai de manhã para o trabalho, já o resto da família cai no mundo. Os meninos vão pulando do jirau, abrindo a porta e caindo no mangue. Lavam as ramelas dos olhos com a água barrenta, fazem porcaria e pipi, ali mesmo, depois enterram os braços na lama a dentro para pegar caranguejos. Com as pernas e os braços atolados na lama, a família Silva está com a vida garantida. Zé Luís vai para o trabalho sossegado, porque deixa a família dentro da própria comida, atolada na lama fervilhante de caranguejos e siris.Os mangues do Capibaribe são o paraíso do caranguejo. Se a terra foi feita pro homem, com tudo para bem servi-lo, também o mangue foi feito especialmente pro caranguejo. Tudo aí, é, foi ou está para ser caranguejo, inclusive o homem e a lama que vive nela. A lama misturada com urina, excremento e outros resíduos que a maré traz, quando ainda não é caranguejo, vai ser. O caranguejo nasce nela, vive nela. Cresce comendo lama, engordando com as porcarias dela, fazendo com lama a carninha branca de suas patas e a geléia esverdeada de suas vísceras pegajosas. Por outro lado o povo daí vive de pegar caranguejo, chupar-lhe as patas, comer e lamber os seus cascos até que fiquem limpos como um copo. E com a sua carne feita de lama fazer a carne do seu corpo e a carne do corpo de seus filhos. São cem mil indivíduos, cem mil cidadãos feitos de carne de caranguejo. O que o organismo rejeita, volta como detrito, para a lama do mangue, para virar caranguejo outra vez."

Caranguejo uçá 
Olha o gordo guaiamum
Quem quiser comprar a mim
Cada corda de dez
Eu dou mais um
Eu dou mais um 
Eu dou mais um 
Cada corda de dez 
Eu dou mais um
Caranguejo uçá 
Caranguejo uçá 
Apanho ele na lama 
E trago no meu caçuá
Eu perdi a mocidade 
Com os pé sujo de lama 
Eu fiquei anarfabeto 
Mas meus fio criô fama
Pelo gosto dos menino 
Pelo gosto da mulé 
Eu já ia descansá 
Não sujava mais os pé


Os bichinho tão criado 
Sastisfiz o meu desejo 
Eu podia descansá 
Mas continuo vendendo caranguejo
Caranguejo uçá 
Caranguejo uçá 
Apanho ele na lama 
E trago no meu caçuá
Tem caranguejo 
Tem gordo guaiamum 
Cada corda de dez 
Eu dou mais um
Caranguejo uçá Caranguejo uçá Apanho ele na lama
E trago no meu caçuá 

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Galeria 3058A recebe o mais novo trabalho de Jorge dos Anjos. Sob curadoria de Anna Guerra.

Confira mais uma exposição na Galeria 3058A.
Dia 27 de julho, na Rua da Consolação 3058, Jardins.
A partir das 19h.



Jorge dos Anjos  

Nasceu em Recife, Pernambuco, em 20 de junho de 1969. Começou a pintar aos 13 anos de idade, em 1982, na cidade de Salvador, Bahia. Auto-didata, seguidor da tradição pictórica de Heitor dos Prazeres, Caribé e Roberto Osvaldo Griot, trabalha em acrílico sobre tela. Sua obra explora temas da cultura popular brasileira, como o futebol, a capoeira, as praias, a pesca, a colheita e a religiosidade, apresentados em cores exuberantes, em meio a uma natureza abundante e generosa, plena de cachoeiras, matas, montanhas e mares. Em 2000, radicou-se em São Paulo, onde vive e trabalha até a atualidade.

exposições coletivas

2010        Bienal SESC “Naifs do Brasil” Piracicaba
2009        “Nossa Arte Negra” Centro Cultural Mestre Assis Embu das Artes
2005       “Salão Nacional de Arte de Paraty” Rio de Janeiro Prêmio de Aquisição
2002        “Salão de Arte Alma Paulista” Centro Brasileiro Britânico São Paulo
1998        Bienal de Artes “Buenos Aires não Dorme” Argentina
1995        III Bienal do Recôncavo Centro Cultural Dannemann São Felix Bahia
                I Bienal Afro-Americana de Cultura Real Gabinete Português de Leitura Salvador Bahia
                Encontro Brasil-África Centro de Convenções Salvador Bahia
1992        I Bienal do Recôncavo Centro Cultural Dannemann São Felix Bahia
1991        “Kabiyesi Le Onire Arte Negra” Casa do Benin Salvador Bahia
1989        “Cultura Negra através da Arte” SENAC Pelourinho Salvador Bahia

exposições individuais

2007         “Naïf Brasil Viva Cores” Galeria Território Brasil São Paulo
1998        Casa de la Provincia de Corrientes Argentina
1997        Galeria Solar Punta Del Este Uruguai
1995        Galeria Ostarte San Sabastian Espanha
                Museu da Cidade Salvador Bahia
1991        “Caminhos dos Orixás”  Galeria e Espaço Cultural Novo Tempo Salvador Bahia

feiras, intervenções, curadorias e encomendas

2009        “SP Arte” (trabalho desenvolvido juntamente com o artista plástico Moacyr Toledo)
leilão de arte no principado de Mônaco promovido pela Fondation Prince Albert II
Curador da exposição “Nossa Arte Negra” Centro Cultural Mestre Assis Embu das Artes SP
2008        Intervenção individual a céu aberto na praia de Pouso da Cajaíba Paraty RJ murais em fachadas de bares
Organização curadoria e participação na intervenção a céu aberto “Muros do Querosene” mais de 120 murais em muros portões fachadas e postes de iluminação no bairro do Morro do Querosene Butantã SP juntamente com outros 35 artistas plásticos e grafiteiros
2007        Intervenção individual a céu aberto quilombo do Campinho Paraty RJ murais em fachadas de edifícios muros e postes de iluminação
2000        Painel 6x2,5m pintado ao vivo durante o desfile de Carnaval Escola de Samba Pérola Negra SP
                Imagens impressas em cartões telefônicos e talões de cheques







segunda-feira, 19 de julho de 2010

Anna Guerra.... O ANEL

Navegando por Cyberartes...


GICLÉE
A palavra vem do francês mas tem sido usada nos Estados Unidos, e conseqüentemente no resto do mundo, para definir um processo de gravação em papel ou tela através de micro jatos de tinta sob pressão. O processo envolve altíssima tecnologia e aplica aproximadamente 4.000.000 de partículas por segundo. É feito por um equipamento chamado Glicée Printer e pode usar até 16.000.000 de cores em uma única impressão. O resultado é uma tela praticamente igual a original. O artista assim pode multiplicar a sua obra, assinando e autenticando cada uma das cópias e possibilitando reduzir o preço de cada trabalho. Claro, ele faz essa multiplicação em um número reduzido para que a obra não se torne demasiadamente abundante. Se ele resolve multiplicar por 5, por exemplo, pode vender por R$ 3.000,00 ou pouco mais, um trabalho que antes só venderia por R$ 15.000,00 e isso é bom para todo mundo. Não há nenhuma novidade nessa prática de multiplicação mas só agora é possível gerar uma impressão em tela como se fosse realmente uma pintura.

Já se faz isso no Brasil e quem me explicou essas coisas foi Anna Guerra que agora está em São Paulo e de malas prontas para uma viagem de exposições onde marcará presença em Lisboa, Frankfurt e outras cidades que não gravei na memória mas inclui uma passagem pelo Louvre, em Paris. Ela me explicou que inicialmente é criado um arquivo digital de altíssima resolução e que o artista pode interferir nele calibrando cores para tornar tudo o mais possível igual ao original. Aí o artista define o número de cópias e depois o arquivo é selado para não possibilitar ser usado outra vez. As cópias são então numeradas, assinadas e protegidas por um verniz. A durabilidade perfeita pretende ser de dois séculos ou pouco menos. Bastante tempo.
Vejo logo uma outra utilidade. Será mais fácil conservar e reproduzir obras antigas com a perfeição absoluta ou quase absoluta. Isso viabiliza termos obras de Leonardo da Vince ou Edvard Munch em museus de cidades que antes nem poderiam sonhar com isso. Claro, entra aí o interesse em preservar a raridade para manter o valor mas isso já é outra questão. Bom, a tecnologia do Giclée Printer é considerada a mais sofisticada em todo o mundo e é bom que artistas como Anna Guerra se mantenham inteiradas sobre isso. Infelizmente não temos aqui imagens de um Giclée de Anna Guerra mas posso me dar ao luxo de escrever olhando para um original pregado na parede, que ganhei de presente anos atrás. Está em muito boa companhia na minha sala e de vez em quando temos uns papos interessantes.

Por Ronaldo Carneiro Leão - pensando em multiplicar algumas coisas.
E Rê Rodrigues - vou multiplicar uma nota de 100 e pregar na parede